das indiferenças sociais

Chega um momento na vida de cada menino por aí no qual ele tem que se tornar adulto. E com a vida adulta, vêm responsabilidades já quase em estatuto de clichê: trabalhar, ganhar dinheiro e viver a vida tentando o máximo possível bancar seus vícios e diversões com seu trabalho e seu dinheiro - esses últimos a gente nunca deixa de ter, mas acha que está tendo pouco porque o trabalho consome demais nosso precioso tempo.

Aí você, que é "músico" por recreação, no inuito de talvez tirar algum com isso, tenta escrever uma música ou tentar um projeto que parta de vias próprias, criações novas mesmo que sobre coisas velhas. E aí percebe que esse tipo de diversão dá trabalho. E você já tem um trabalho. Aí você percebe que ter esse trabalho todo não vale a pena quando se trata de diversão, aí você deixa tudo pra trás, e vai trabalhar naquele que é fixo e exige menos de você. Claro, ora, pois. Convenhamos, você já tenta se enganar dizendo que quer viver fazendo uma coisa barata mas que te completa, que é a filosofia; sabe que desse mato dificilmente sai cachorro. Aí a gente pensa nos projetos de vida dentro da filosofia, e você se vê andando de bicileta todos os dias (não por prazer, por necessidade); você se vê comprando três cartelas de 24 ovos cada porque o resto tá caro, e dá pra fazer tudo com ovo; você se vê tendo que pedir dinheiro emprestado e fazendo dívidas que, nesse ritmo, jamais vai pagar. Aí você, músico, aspirante de artista, filho de pessoas pobres e filósofo sem doutrina monetária, acaba por desistir de tudo.

Por quê? Porque o trabalho da vida mundana é que te mantém respirando, comendo, se divertindo de verdade. Porque por mais que digam que um livro é o alimento da alma, seu excesso me emagreceram 10 kg em cinco meses. Porque a gente adora pensar, mas percebe que coisas fáceis e prazerozas foram cuidadosamente encaixadas num processo do capital, e agora é parte dele, a ponto de incorporar a si todas - ou quase todas - as coisas que são prazerosas. E agora percebe que seus quatro anos estudando uma coisa difícil, demasida humana, estritamente racional, prazerosa e tudo o mais não vão te possibilitar uma casa, comida e outras coisas materiais necessárias. E se assim forem, necessitará duas vezes mais do que o tempo que você tem disposto para atividades profissionais. Ou seja, ou se come, ou se tem vida.

Aí, eu me pergunto o que fazer. Por, ora bolas, convenhamos: o tempo foi passando e eu fui vertendo por essas paragens. Agora que percebo minha dificuldade nelas, percebo em consequência meu medo delas. E agora que tenho medo, nem elas, nas quais sou relativamente bom, me parecem tão boas assim. E agora estou com medo do dia que vem em seguida, porque até meus ovos estão acabando.

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