La Petit Mort

   
     Fui programado pra morrer. 
     Fui, fui sim, e não há quem me prove errado. Sei até quando vai ser: de manhã, às seis e meia da madrugada, na cama de minha vizinha. 
     Bosta. Quando eu desejava aquela frígida de traseiro largo, ela me esnobava, fazia doce... Agora que consegui, a desgraçada me vê morrer, lindo. Bom, vai ser ela mesmo. Vai ser ela ou qualquer outra. Não, não, pior ainda, vai ser ela. Por triste que possa parecer, vai ser ela; ela nem era tão bonita assim, mas me acendia a libido. Em churrascos, me ausentava por pelo menos uns cinco minutos quando ela aparecia com as infindáveis calças de ginástica que toda mulher que sabe que é gostosa usa - também aquelas que sabem que não são, e que torcem pra alguém as olharem e se despirocarem com sua imagem -, e minha vizinha tinha pelo menos um contâiner cheio dessas. Nunca vi ela repetir nenhuma; de tanto que olhei, decorei a costura que separa a divisão natural do sexo.

De volta à minha morte. 

     Vai ser numa sexta feira, vou ter uns 48 anos, data visivelmente incerta. Vou ser um músico, filósofo e praticamente - mas não tecnicamente - virgem. (Não, não tem nada a ver com animais domésticos. Não.) Terei, então, uma motocicleta de certo porte grande, e um apartamento financiado, não sei em quantas vezes - passa de seis anos (sempre passa)-. Calvin ainda estará comigo; quanto às mulheres, por esse tempo, estarei frizando minha preferência naquelas que não têm o tempo dedicado como retorno pelo sexo, mas sim meus cinqüenta reais. E ainda virgem. É triste me ver assim; queria dar beijos infindáveis numa moça em particular, por esses dias em que tive essa premonição de mim mesmo, e que me atrai as vontades absurdamente. Mas sei que não dura; toda vez que escrevo algo e me refiro às minhas paixões infecundas, cito mulheres distintas. Salvo duas excessões, me apaixono absurdamente rápido. Mas é como palha de aço, quando encostamos uma bateria: queima e é bonito, curioso, meigo e tudo o mais, mas se desfaz com o fogo e na velocidade desse fogo que a consome, e deixa sujeira pra alguém limpar, logo após o experimento.

Comentários

Postar um comentário

Comente aqui. Pode falar mal, bem, o que for - o diabo a quatro. Gostou, comenta, não gostou, comenta também. Críticas sempre serão bem recebidas, desde que sejam criativas e construtivas.

Postagens mais visitadas